setembro 04, 2002

A coluna do Mário Prata, hoje, fala da terrível sensação de se ter todos os passos monitorados na cidade, sob a desculpa de segurança. Uma grande amiga diz que não assiste filmes e/ou seriados sobre espionagem, CIA e outros que tais porque fica sempre impressionada com essa coisa de invasão de privacidade. Para ela, daqui a pouco só vamos conseguir ficar sem vigilância no banheiro de casa – e isso só nas casas onde as pessoas não quiserem colocar câmeras ali.

Adoro seriados e filmes de espionagem. Mas de vez em quando fico lá com minhas cismas sobre essa coisa de um organismo qualquer ter acesso a tudo o que faço ou falo, em casa ou na rua. Se eu quiser dar uma cutucadinha no nariz, discreta, vou pensar duas vezes. Será que não vai ter uma maldita câmara me mostrando? E a coisa fica ainda pior com esse negócio de pegadinhas que fica aparecendo na TV todo final de semana...

É verdade que, no caso das pegadinhas, para minha carinha aparecer na televisão, vão ter de pedir autorização – que eu não vou dar -, sob pena de serem processados por abuso de imagem. Mas, e se mostrarem sem autorização? Mesmo jogando um processo em cima dos caras, quem é que vai salvar minha imagem, totalmente destruída depois de aparecer para o mundo com o dedo no nariz? Bom, terei meus 15 minutos (acho que nem é tudo isso) de fama e, de quebra, terei a possibilidade de ganhar algum dinheiro. E o tempo todo vou ficar rezando para que seja verdade que a memória do povo é curta...

Mas voltando à segurança e invasão de privacidade, acho que esta é uma questão basicamente ética. Pra ser mais exata, de governantes éticos. Uma pitadinha de bom senso também não faz mal a ninguém.

Câmeras para vigiar cruzamentos, estradas e avenidas, para coibir abusos no trânsito, tudo bem. Se o cidadão não é suficientemente cidadão para cumprir as leis, mesmo que não concorde com elas, então precisa mesmo de vigilância cerrada. Também acho que tudo bem ter a chamada vigilância eletrônica em locais sujeitos a assaltos.

Mas não me venham com grampos no meu telefone ou escutas na minha casa. Sou daquelas pessoas travadas, que não consegue sequer abrir a boca diante de um microfone. Não consigo pensar em como seria se descobrisse alguma invasão desse tipo em casa. Acho que pirava.

De qualquer forma, isso tudo é coisa que, na minha cabeça, só atinge pessoas de muita importância em alguma ordem geral. Por enquanto, estou no meio do povão – portanto, bem longe desses perigos, acho...

setembro 01, 2002

Domingo de sol radioso, mas baixa temperatura. Enfim, um dia perfeito, ainda mais porque é domingo e a cidade está totalmente tranqüila, sem barulho. Morar em Sampa tem dessas coisas. De repente, a gente se vê achando a cidade maravilhosa, só porque está tudo quieto, o sol brilha e a temperatura está amena. A cidade surpreende.

Posso dar a impressão contrária, mas adoro esta cidade. Em nenhum lugar do mundo que eu conheça tenho essa sensação de lugar ao qual pertenço. É poluída, sim. Barulhenta, com certeza. Cinza, muito, na maioria dos lugares. É quase sempre feia, mas tem encantos que não encontro em outro lugares.

Provavelmente porque não vivo em outro lugar. A convivência cria referências, indicações, laços. Mas não sei se teria, em outra cidade, a mesma relação que tenho com esta. Gostaria de experimentar. Mas São Paulo sempre estaria presente na minha cabeça como uma referência de lugar onde moro.

Claro que existem outros lugares maravilhosos no mundo. O Rio, por exemplo, é, mesmo a cidade maravilhosa. As paisagens que a cidade oferece são absolutamente deslumbrantes e não me espanta que os estrangeiros se apaixonem pela cidade. Para mim, porém, é uma cidade para passear, curtir – e voltar. Não gostaria de morar lá – não me perguntem porque. Nunca pensei no Rio como um lugar de morar.

Outras cidades já me deram vontade de deixar Sampa pra passar um tempo fora. Boston é uma. Nunca fiquei muito tempo lá, mas toda vez que fui fiquei com a sensação de que deve ser um lugar agradável, bom de se passar bastante tempo. É grande sem ser exagerada, é bonita e fica perto do mar. Do outro lado dos Estados Unidos, tem San Francisco, pela qual me apaixonei rapidinho. As casas, todas com bay windows, são de um encanto envolvente. E também tem mar.

Mais do que todas, porém, é Barcelona que mexe com minha sede de mudança. A cidade é louca de pedra, literalmente. No bairro histórico, é pedra em cima de pedra. Fora de lá, as avingudas e passèigs são de um charme quase maior do que Paris. E, sobretudo, é só olhar fotos de lá que ouço o chamado pra conhecer melhor. Barça, més que mai – é mais do que melhor mesmo? E tem mar...

Acho que já deu pra sacar que meu negócio é a maresia. Pela definição do Josep Pla, sou bicho de terra, aqueles que gostam de ter o mar como fundo de um vaso de flores colocado na janela. Não saberia viver dele, ou sobre ele, acho. Mal sei nadar, tenho um pavor mortal de mergulhar – falo de mergulho mesmo, aqueles que exigem fôlego e coordenação, não aquela coisa rápida de cair na água e logo voltar à superfície. Adoro ver documentários sobre o fundo do mar, provavelmente porque tenho certeza de que nunca vou conseguir ver tudo aquilo no vivo e na cor. Então, que seja pela TV... Bom, um dia, se eu criar coragem... Quem sabe?

Mas o prazer de caminhar ao longo da praia, com as ondas baixinhas molhando os pés e o sol esquentando a areia, isso eu acho 'introcável'. Não há substituto. É por isso que meu projeto velhinha é viver em Paraty.

Paraty é daqueles lugares mágicos, cujo bom astral é quase palpável. E fica razoavelmente perto de Sampa, de forma que dá pra gente sair de lá numa sexta à noite e chegar aqui a tempo de aproveitar um fim-de-semana cultural, com passeios em livrarias, cinemas e teatros. A gente se abastece aqui daquele tanto de coisas que o espírito precisa e vai cuidar do corpo à bira-mar, passeando no meio do casario todo de Paraty. De quebra, dar uma volta pelas ilhas de vez em quando...

Mas é bom não contar muita vantagem do lugar, que já é bem mais conhecido do que eu gostaria. Quando alguém disse que as boas idéias têm de ficar guardadas na cabeça, acho que tinha exatamente isso em mente. Não conte – se mais gente ficar sabendo, a boa idéia passa a ser de todos. E, pra ficar no meio da multidão, a gente fica em Sampa mesmo, esperando o final de semana pra lembrar o que é silêncio...