outubro 13, 2007



Reflexões


Terminei de ler a tese, não sei se de mestrado ou de doutorado, de uma amiga psicóloga. Chato? De jeito nenhum! Foi um dos textos mais bonitos que li nos últimos tempos – é verdade que fui para ele sem nenhuma expectativa a não ser ajudar uma amiga a ter um texto sem erros de português. Era só uma revisão. Acabou sendo um aventura.

Meu gosto por palavras e textos já vem de muito tempo. E quando as duas coisas se juntam para esclarecer e/ou encher olhos e cabeça de pensamentos intrigantes, que fascinam e prendem, melhor ainda. E foi assim, prazeiroso.

Transcrevo um trecho, que ela transcreveu de um outro autor, mas que cabe à perfeição no tema que ela defende: “o meu tecido difere do teu quadro, porque nele gastei o meu tempo, que não foi o teu tempo. Mas, com o meu tempo também saberei fazer o meu quadro. E o teu quadro e o meu quadro provarão que somos tão diferentes quanto foram nossos tempos”. O texto saiu da apresentação de uma mostra do colagista Tide Hellmeister, autor da obra que aparece aí em cima. E, claro, refere-se aos trabalhos de colagem.

Outro trecho, este dela mesma, falando sobre o trabalho na clínica onde se reúnem aqueles que ela mesma chama carinhosamente de “louquinhos” – na clínica, eles trabalham cacos de mármore e fazem objetos utilitários:

“Aprender com as pedras. Juntar e colar de um jeito diferente e novo, pode dar em alguma outra coisa. Aprender a não jogar tudo fora porque se a gente olhar bem, pode achar alguma coisa legal para fazer. Persistir. A dureza das pedras esconde uma fragilidade que requer muito cuidado. Seus veios e poros nos dizem onde cortar, preencher. A qualquer interferência brusca, ela quebra. Às vezes, quase no final do trabalho, um pequeno golpe dado no lugar errado desmonta tudo o que foi feito. E, no entanto, o erro não foi “meu”, não sou “incompetente”; só não prestei atenção ao que a pedra dizia.

O outro-pedra ensina a olhar para além de mim: minhas dores, fragilidades, meus cacos. Ensina a atender às necessidades dela, a olhar bem quais são suas características, prestar atenção ao que ela requer. Para ressaltar suas qualidades não visíveis é necessário desbastar, colar, polir, juntar; ensina, também, que nem sempre ela se curva a meus desejos, aceita minha intervenção, mesmo que cuidadosa e carinhosa. Às vezes ela, simplesmente, me ignora e impõe outro destino.”

Como é bom ter amigos com essa sensibilidade!