agosto 02, 2005

Li, com muita tristeza, o último post do Flávio, um menino muito querido, no Crocodilo Chan que ele mantém. O título, afrancesado, é 'c'est triste'. E é mesmo, muito triste. Ele fala de uma amiga russa, menina de 21 anos, que teve de fazer um transplante de fígado e não resistiu. Ele sabia que ela tinha de fazer essa cirurgia - mesmo lá da Austrália, onde estava até o final de junho, ele mantinha contato com ela via mensagens de celular. Só não sabia que em 10 de junho a menina tinha ido.

Escreveu um monte de e-mails e só agora teve uma resposta, do pai dela. E me ocorreu, de novo, que não é justo nem certo um pai ter de comunicar ao mundo a morte de uma filha. Não é natural. A gente aprende, desde pequeno, que todo mundo nasce, cresce, amadurece, envelhece e morre. Assim, o natural é que os mais novos enterrem os mais velhos. É assim que tem de ser. Não o contrário.

E como o contrário tem acontecido! Parece que cada vez mais o mundo é dos velhos. Os jovens, que já não são muitos, são mandados para guerras, enfrentam revoltas, são vítimas de balas perdidas e até de doenças que não deveriam ter. Alguns se deixam levar sem medo por vícios que abreviam suas vidas assustadoramente. E vão diminuindo em quantidade, tornando-se mercadoria cada vez mais preciosa. Na linha mercadológica da oferta e da procura, a procura está ficando maior, o que aumenta o valor da oferta. Na linha do raciocínio de vida, o mundo está ficando povoado de velhos...

Mas o que eu sinto mais passa bem longe da faixa etária média do mundo. Tem a ver com sentimento. Com dor. Com tristeza. A frase que eu escrevi um pouco mais acima, que nenhum pai deveria enterrar o filho, foi dita pelo meu então sogro, justo no dia em que enterrava o filho mais velho. Sem lágrimas, mas com profunda tristeza, veio a constatação: não é natural.

Voltei a lembrar da frase há alguns anos, quando uma amiga querida também teve de enterrar o filho, um príncipe de 18 anos que, descuidado, despencou de uma janela. Ela estava firme e bem até onde pode ficar bem uma mãe que perdeu o único filho. Explicava que ele tinha vindo pra alegrar a vida dela por um tempo e que tinha cumprido a missão com sucesso. Ela ficava agradecida pelo quinhão que teve. Mas eu sei que isso não pode ser verdade.

Pais não deveriam enterrar filhos, não deveriam perder filhos. Não é natural e deveria ser considerado ilegal. Assim como as estações do ano se sucedem, filhos ocupam o lugar dos pais. É assim que tem de ser, é o certo, é o natural.

Pais não deveriam enterrar filhos. Pra mim, isso não existe. Eu me recuso a acreditar que existe.

2 comentários:

Flavs disse...

Obrigado pelo sei comentário Lenita. Também me recuso a acreditar que existe. É muito triste.

Márcia disse...

Acontecer coisas assim é uma desordem desnatural das coisas, né? Não dá para acreditar, entender, compreender. E a dor deve ser infinita. Não deve sair nunca do coração. Só peço para que a ordem natural se mantenha em nossas vidas. Te amo, mamãe! SEMPRE!